Pesquisa aponta perfis empreendedores.

Após trabalhar alguns anos lidando com empreendedores, o sócio-diretor da consultoria de engajamento Santo Caos, Jean Michel Galo Soldatelli, notou que o nível de engajamento de micro e pequenos empreendedores variava muito. “Fizemos um estudo para entender um pouco sobre o engajamento desses empresários em relação a conceitos do empreendedorismo.”
A pesquisa foi feita com 548 microempreendedores de São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Pernambuco, Paraíba, Amazonas e Minas Gerais. “A grande questão é que o que mais motiva esse microempreendedor a abrir um negócio é a libertação, independência e lucratividade. E as principais dificuldades são a falta de benefícios, carga de trabalho e responsabilidade. Logo, a maioria quer ter flexibilidade mas não quer ter responsabilidade.”
Segundo ele, esses dados apontam que uma das características do microempreendedor brasileiro é ser um funcionário sem chefe. “Normalmente, o chefe quer ter responsabilidades. Ter espírito empreendedor é ter responsabilidade. E a maioria não deseja isso.”
Soldatelli afirma que o primeiro ponto para engajar os microempresários com o empreendedorismo é a conscientização. “A grande dificuldade é a falta de capacitação. Com ela vem a confiança e a durabilidade do negócio. O segundo ponto é trabalhar o orgulho deles. Muitos não acham que têm uma empresa e nem uma história para contar.”
O estudo demonstra que o perfil do microempreendedor brasileiro não corresponde ao dos criadores de startups que estão no mercado buscando investimento. “Identificamos quatro categorias de perfis. O mais frequente é ‘Seu Vendinha’, que equivale a 35 % dos entrevistados.”
O objetivo desse empresário é manter o relacionamento com sua clientela fiel. “Ele não trabalha muito a questão administrativa e é mais operacional. É o perfil que mais representa o medo por não ter capacitação. Ele até quer aumentar as vendas e incluir mais serviços, mas não pretende aumentar o número de unidades por ter medo do crescimento.”
O segundo perfil é o ‘Panfletero’ que também é muito operacional. “Geralmente cria o negócio no ramo em que já atuava. Tem muito conhecimento sobre a operação mas pouquíssimo sobre a administração e não tem vontade de ir fundo nisso. O foco não é crescer, mas ser reconhecido. É alguém que trabalha a comunicação com carro de som e panfletos. Procura aumentar as vendas, mas não tem estrutura e visão empreendedora para criar uma rede. Esse perfil corresponde a 24% dos entrevistados”, afirma.
‘By the Book’ representa 25,5%. “Ele segue todas as regrinhas da administração. Antes de abrir o negócio planeja bem, procura ajuda do Sebrae e se informa sobre o mercado. Tem mais noção administrativa do que operacional e pertence a uma classe social mais alta.”
Por fim, tem o ‘Business Gandhi’, um tipo especifico pois a sua motivação é a filosofia com a qual encara seu negócio. Ele não quer ser um grande empreendedor. Sua motivação é a causa do empreendimento.
“Por exemplo, ele abre um café e não considera que tem um café, mas um espaço de convivência. Ou então, abre uma clínica de fisioterapia mas diz que tem um espaço de bem-estar. Esse perfil representa 15,7%.”
Coach de alta performance, Patrícia Marinho afirma que grande parte dos empreendedores brasileiros começam seus negócios pelas razões erradas.
“Me deparo com muitas pessoas querendo empreender porque viram o outro ter sucesso e não porque realmente têm uma motivação, o que é primordial para que não vivam no piloto automático, trabalhando só para pagar contas e rezando pro dia acabar”, afirma.
Segundo ela, quando a pessoa tem noção do que deseja atingir, tudo se torna mais fácil. “Ter foco é indispensável para fazer a diferença e saber aonde se quer chegar. O maior desafio do empreendedor é sair da zona de conforto. Trace um planejamento concreto, tenha uma agenda produtiva e desative o botão soneca do celular.”
Sócio-diretor da consultoria Vecchi Ancona – Inteligência Estratégica, Paulo Ancona diz que nem todos que praticam o empreendedorismo têm espírito, formação, perfil, competências ou capacidade empreendedora.
“O fato de querer ter um negócio não significa que terá condições para manter estratégias e gestão adequadas. O empreendedor de fato deve possuir iniciativa, liderança e capacidade de tomar decisões. Deve, ainda, ser capaz de ter boa dose de capacidade analítica para enxergar adiante e tirar conclusões positivas”, avalia.
Ele diz que é comum haver confusão entre perfil arrojado, boas ideias e vontade, com capacidade de empreender. “A atividade empreendedora exige experiência em uma série de aspectos e isso se adquire também com o tempo e com vivências. Fora disso, só ‘iluminados’ nascem com a intuição correta e necessária para empreender com sucesso.”
Segundo ele, muito se fala sobre empreender e pouco sobre o sucesso dessas atividades. “É sabido que grande parte dos empreendimentos que nascem somente de ideias, vontade ou arrojo, acabam morrendo nos três primeiros anos de vida.”
Ancona diz que além da vontade, o empreendedor deve ter capacidade de aprendizado rápido e de colocar tudo o que foi absorvido em prática. “Tendo em vista que o mercado muda com muita rapidez, o que era uma iniciativa brilhante pode estar ultrapassada em questão de meses. Além disso, a assertividade e a capacidade de focar e se posicionar de forma clara e rápida perante os desafios fazem de um empreendedor alguém capaz de reagir com clareza e rapidez, adequando e mudando o negócio ou a forma de sua gestão, sempre que necessário.”
Formado em música e com MBA em marketing digital, o dono da Nuveo Smartcloud, Luciano Freitas considera que o problema que enfrentou quando tinha chefe foi justamente a questão da hierarquia. “Acho que o chefe do século passado se apega muito à hierarquia e impede o funcionário de ser ele mesmo. O que diferencia um chefe ultrapassado de um mais flexível é a informação. Antes o chefe podia tratar as pessoas mal e nada acontecia. Hoje, todos nós temos informação. Logo, temos poder.”
Ele afirma que como empreendedor as dificuldades são outras. “Não tenho mais chefe mas tenho sócios, investidor e vários clientes. A cobrança é maior. Por mais que tenhamos certa experiência, sempre enfrentando novos desafios. Costumo dizer que ao empreender a chance de não dar certo é de 50%, temos de nos apegar aos outros 50% e fazer virar 100%. O grande mote do empreendedor é não desanimar, alguma coisa vai dar errado, é normal, mas não podemos desistir.”
por Cris Olivette